De Itamargarethe Corrêa Lima
Jornalista, Advogada e Pós Graduanda em Direito Tributário
O Nepotismo é um tema muito debatido e que evidencia um confronto de Princípios Constitucionais. Nos quatro cantos do País, não é de hoje que a classe política é rechaçada por conta do assunto.
Após uma rápida consulta na internet, encontramos dezenas de artigos
inscritos sobre nepotismo, ou seja, gestores que indicam parentes para os
cargos em comissão, chefia, direção e assessoramento, e na grande maioria
tecendo duras críticas àqueles que ainda recorrem a tal prática, batizada como
imoral e nefasta ao serviço público.
A difusão desta ideia, por força do chamado efeito midiático, permite
que a população, como papagaio de pirata, propague os argumentos contrários
elencados pelos colegas, que em alguns casos, posicionam-se de acordo com os
interesses próprios ou dos dirigentes patronais.
No Maranhão, desde o dia 01 de janeiro, quando o governador Flávio Dino
foi empossado, esse tema vem sendo bastante abordado. Fala-se em moralidade,
impessoalidade, eficiência, nepotismo cruzado, enfim.
De maneira geral, todos os dias, os blogueiros de plantão publicam
nomeações de parentes dos titulares de primeiro escalão, tentando, assim,
fomentar uma situação incomoda na atual gestão.
Comungo da tese que cada caso é um caso e assim deve ser analisado.
Senão vejamos: A Constituição Federal, em seu art. 37, incisos I e II, que
trata da administração pública, é bem clara quanto à investidura em cargo
público. Estabelece tal preceito que a "investidura em cargo ou emprego
público depende de aprovação em concurso público de provas ou de provas e
títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na
forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para o cargo em
comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração." (negrito
nosso).
Em uma análise rápida, fria e pautada na legalidade, chegamos à
conclusão que, no tocante aos cargos em comissão, a nossa Carta Magna adotou
como critério objetivo, apenas, a livre nomeação e exoneração. Em nenhum
momento a lei falou em parentesco, consanguinidade ou coisa parecida.
Desta feita, por mais que se rejeite a ideia ou possibilidade de
nomeação de parentes (bem como de qualquer outra pessoa) não há como negar a
permissão legal do inciso II do art. 37 da CF/88. Assim sendo, vedar ou limitar
a nomeação de parentes, sem permissivo legal, e ainda assim permitir que outras
pessoas sejam nomeadas livremente, ensejaria em atentado ao Princípio da
Isonomia, ocorrendo em discriminação.
Mas por outro lado, alguns juristas renomados, responsáveis pela chamada construção doutrinária, embora estabeleçam que o critério subjetivo para tais nomeação, repousa no quesito confiança, também posicionam-se como boa parte da imprensa nacional e local. E a lista dos críticos não para por aí.
Pressionados pelo efeito devastador provocado pela mídia, apenas para
satisfazer a plateia leiga, no tocante ao tema, na Medida Cautelar em sede de
Ação Direta de Constitucionalidade, o STF firmou o entendimento que o nepotismo
denota ofensa aos Princípios da Impessoalidade, Moralidade, Eficiência e
Isonomia.
Além deste posicionamento, para dirimir qualquer dúvida sobre o tema, a
Suprema Corte brasileira editou a Súmula Vinculante de nº 13, a qual diz: “a
nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por
afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de
servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou
assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou,
ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em
qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a
Constituição Federal”.
Diante dos argumentos acima elencados, verifica-se a existência de um
confronto de Princípios Constitucionais. Como pesar, então, qual princípio se
sobrepõe ao outro? Qual é o mais importante? De forma abrupta, embora sendo um
ato discricionário, vincular o ato de nomeação de parente à
"corrupção" contraria os Princípios Constitucionais da Isonomia (art.
5º, caput), da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III) da Presunção de
Inocência(art. 5º, LVII), e da Legalidade(art.37). Pois estaria imputando um
crime contra a administração pública a alguém somente pelo fato de ser nomeado
por um parente com poder para nomeá-lo.
Na outra ponta da esteira, os Princípios da Impessoalidade, Moralidade e
Eficiência(todos elencados no art.37 da CF), segundo o STF, embasam as vedações
ao nepostismo cruzado. Acredito que o "favorecimento" implícito ao
conceito nepotismo não reside no ato de nomeação (haja visto o princípio da
isonomia), mas no exercício irregular do cargo ou na execução com desvio de
finalidade.
Somente haverá "favorecimento", "privilégio" ou
"benefícios", por exemplo, quando o comissionado receber remuneração
sem trabalhar, receber diárias sem justificativas, exercer atividade sem
capacitação técnico-profissional, com abuso de autoridade, desvio de finalidade
pública etc.
Assim sendo, na contramão dos fatos, comungo de opinião distinta dos
colegas, dos doutrinadores, inclusive da Suprema Corte, o que me assegura o
Estado Democrático de Direito. Portanto, ratifico a tese que cada situação deva
ser analisada, isoladamente.
Por exemplo, digamos que um prefeito ou governador resolva nomear para o cargo de Secretaria de Saúde a esposa, que é médica, especialista, com mestrado e doutorado em determinada área, e conhecimento técnico reconhecido.
Ora, de acordo com a lei, o critério objetivo para que um cargo em
comissão seja ocupado é a livre nomeação e exoneração, e para os doutrinadores,
o critério subjetivo é a confiança. Pois bem, no exemplo acima, estaríamos
diante do chamado nepotismo? Seria justo essa definição?
Seria imoral e impessoal a nomeação pelo simples fato da nomeada ser
esposa do nomeante? E a isonomia fica onde? O que faz com que as pessoas pensem
que os parentes podem meter a mão na cumbuca e os que não são parentes estão
livres desta tentação? O fato é que ao ser nomeado para o cargo em comissão,
necessariamente, o nomeante escolhe pessoas com estreitas ligações e
confiáveis, ou será que alguém é louco o suficiente para nomear o seu inimigo?
Certamente que não, né? Ou tem alguém que pensa o contrário?
Agora vamos trabalhar com outra possibilidade. Digamos que esse mesmo
gestor, resolva, em um profundo ato de desatino, nomear para Secretaria de
Educação do estado sua companheira, que mal sabe ler e escrever, ou então o
filho para a Secretaria de Fazenda, dois meses depois de ter concluído o ensino
médio.
Você consegue perceber a diferença? Neste caso, mesmo a contra gosto,
embora preencha os princípios da legalidade, isonomia, critérios objetivo e
subjetivo, estaríamos, sim, diante de ofensa aos princípios da moralidade e
impessoalidade.
Portanto, impessoal e imoral é tecer criticas sob a nomeação de “a” ou “b”, taxando-a como sendo nepotismo, desprezando assim o perfil profissional do nomeado, pelo simples fato deste ter alguém próximo ocupando cargo no primeiro escalão.
O que
não ocorre quando tais críticas tem como escopo um nomeado despreparado, com
base na falta de conhecimento livresco, para a função a qual deva exercer.
Apenas não acho justo criticar por criticar ou, ainda, deixar com que as
relações consanguíneas e afins, sobreponha-se a questão técnica no gerir da
administração pública.
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